Capacitor eletrolítico: um “defeito” diferente
Ao ler este título você deve estar pensando: – como um capacitor eletrolítico pode apresentar um “defeito” diferente?
Até onde todos nós sabemos só existem (ou existiam!) três defeitos possíveis para um capacitor, seja eletrolítico ou qualquer outro: perder a capacitância, apresentar “fuga” no dielétrico e entrar em curto (que não deixa de ser uma fuga, só que maiorzinha!).
Bem, isso era antigamente. Com o surgimento das fontes chaveadas apareceu a tal da ESR, coisa que até década de 90, mais ou menos, ninguém tinha ouvido falar nem sabia o que era.
Mas como diz um ditado popular, quando aprendemos todas as respostas, a vida muda todas as perguntas.
Pois bem, o post desta semana surgiu de uma consulta do técnico Fábio Vinco que se deparou com uma situação bastante curiosa, para não dizer insólita, ao reparar um televisor AOC modelo LC32D1320 e que parece um bom exemplo para o ditado citado acima.
Segundo o Fabio, a falha era uma das mais comuns e bastante conhecida da maioria dos técnicos: – capacitor C953 da linha de 5V sem capacitância ou, como dizem por aí, “capacitor seco”, ou melhor, com ESR elevada como vemos na figura.
Identificado o problema o Fabio não pestanejou e partiu para a troca do “laranjinha” original (C953) da marca Elite que estava no televisor, que apresentava uma ESR da ordem de 1,9 ohms, por um novo da marca Huang também de 330uF/16V para 105ºC e o televisor funcionou, mas … (sempre tem que ter um “mas”) ao colocar o dedo do capacitor “novo” o bichinho esquentava tanto a ponto de quase queimá-lo.
Ora, todos nós sabemos que um capacitor não pode esquentar e obviamente se o técnico não prestar a tensão a este “pequeno” detalhe e “deixar pra lá” teremos uma explosão na certa.
Neste momento ele começou a maratona de tentar descobrir o que estaria acontecendo.
Não irei aprofundar aqui com todos os detalhes os passos que ele seguiu por julgar que não são essências para as conclusões, farei apenas um breve resumo de algumas medições do Fábio:
1) Verificação do ripple na linha de 5V com osciloscópio: 1,2Vpp o que é relativamente alto neste caso;
2) Medida da corrente de consumo: normal e estável;
3) Medida da ESR do capacitor novo aproximadamente zero ohm.
Que tal retirar a carga da fonte e ver o que acontece? Foi o que ele pensou.
Sem carga o ripple caiu significativamente e o capacitor não esquentou.
Numa situação destas ele tomou uma decisão que me parece razoável, ou seja, trocou o capacitor por outro de marca diferente (desta vez um EPCOS 470uF/16 – 105ºC ESR = 0,1 ohm) e para surpresa dele a temperatura parecia maior ainda o que foi comprovado com um termômetro infrared em 61ºC!
Nova troca, desta vez para um da marca SAM YOUNG que embora esquentasse menos ainda apresentava 44ºC.
Observe que cada capacitor, embora de marcas diferentes, apresenta um comportamento estranho com relação à dissipação de calor em seu corpo.
Por que isso? Se em todos os casos a ESR estava baixa?
Aliás, aqui eu coloco uma pergunta: será que ESR alta faz um capacitor esquentar?
Neste momento, o Fábio relata que teve a ideia de retirar um capacitor de uma placa de um monitor LG que estava condenado e usá-lo.
Pegou um da marca XUNDA mediu a capacitância (471uF) e a ESR próxima de zero ohms e colocou no tv que estava sendo reparado e agora a temperatura ficara em 34ºC que é praticamente a temperatura ambiente e o ripple praticamente desaparecera.
Incrível! Como pode acontecer isto com capacitores novos e de marcas conhecidas?
Tirando conclusões
Quando eu recebi esta história pensei que ela deveria ser repassada para a comunidade de técnicos, em primeiro lugar, para servir de alerta de um fato que, geralmente, não se dá atenção após a troca de um capacitor: – verificar se está aquecendo .
A partir de agora uma boa prática após a troca de um capacitor é fazer o “teste do dedinho” e ver se está aquecendo como fazemos ao trocar um transistor de saída horizontal.
O segundo ponto é tentar entender o que poderia estar acontecendo, pois com eu sempre digo, não basta resolver o problema é importante saber os porquês.
Se o problema fosse apenas com uma marca eu arriscaria duas hipóteses:
1) Tensão de trabalho errada impressa no invólucro do capacitor;
2) Polaridade invertida impressa no invólucro do capacitor.
Descartadas estas hipóteses, já que eram três marcas diferentes, só podemos pensar em outra que se chama qualidade, ou melhor, má qualidade.
Pensemos um pouco. Como se produz calor com auxílio da eletricidade?
Fazendo uma corrente passar por uma resistência, correto?
E no caso do capacitor onde está a resistência?
Seria a ESR? Até poderia ser se estivesse alta o que não era o caso.
Sugeri ao Fábio que fizesse a seguinte experiência:
– Alimentar cada capacitor com uma tensão DC “pura” e colocar um miliamperímetro em série para monitorar uma possível corrente de fuga tomando o cuidado de começar com uma tensão baixa, para evitar o pico de corrente inicial de carga, e ir aumentando a tensão até um valor próximo da tensão de trabalho.
Feita a experiência o resultado só fez complicar as coisas, pois além de não aparecer corrente de fuga significante os capacitores não esquentaram.
Mas, pensando bem, o resultado levou a pensar noutra questão: na fonte do televisor o capacitor recebe tensão pulsante mesmo depois de retificada pelos diodos e, importante, de frequência alta. Aliás, é por causa da frequência alta que a ESR passou a ter que ser considerada depois do surgimento das fontes chaveadas.
Existe outro parâmetro além da ESR?
Sim, existe, embora seja pouco “badalado”. É a ESL que corresponde a indutância em série equivalente e seu valor é da ordem de nano henry (ou deveria ser), por isso costuma ser desprezado.
Agora, lembremos que uma indutância quando submetida a uma corrente alternada produz uma reatância indutiva cujo valor é diretamente proporcional à frequência, ou seja, quanto maior a frequência maior a reatância indutiva.
Sendo assim, creio que seja possível se ter uma dissipação de potência reativa no capacitor através da ESL que o faz aquecer.
Numa de troca de e-mails com o Fernando José sobre este assunto ele chamou a atenção de um ponto interessante.
Em muitas fontes chaveadas encontramos capacitores cujo invólucro apresenta sinais de aquecimento (que também pode ser causado pelo ambiente em torno dele) e o próprio “inchaço” na parte superior indica que houve aquecimento.
Embora eu não esteja afirmando que o problema dos capacitores do Fábio tenha sido causado pela elevação da ESL fica aqui uma suspeita e a necessidade de nos preocuparmos com mais um parâmetro que por enquanto, até onde eu sei, não temos como medir.
Mais uma experiência
Sugeri ao Fabio que fizesse mais uma experiência.
Construir uma fonte usando um transformador e um diodo e colocar cada um dos capacitores “esquentadores” como filtro para ver se eles aquecem ou não.
Se não aquecer, e eu estou apostando que não vai aquecer. o problema parece estar realmente relacionado à frequência e, portanto a ESL deve ser a culpada.
Mas esta parte do mistério vai ficar para a próxima semana depois que o Fabio fizer as experiências.
Aguarde as cenas do próximo capítulo. Vai ser emocionante.
Se você passou por alguma situação parecida coloque sua experiência nos comentários, pois certamente será útil para todos.
Moral da história
Já não se faz mais capacitor como antigamente, ou melhor, como disse Einstein “novos problemas exigem novas soluções”.
Até sempre.
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