Qual chuveiro esquenta mais a água?
Qual chuveiro esquenta mais a água?
A polêmica, qual chuveiro esquenta mais a água, de acordo com a figura ao lado, foi proposta recentemente por Donizete Silva no grupo Universo da Eletricidade no facebook.
Muita coisa foi dita por lá e achei que merecia um post sobre o assunto.
Como eu adoro polêmicas vou começar com uma provocação.
Na verdade o correto seria perguntar: – onde a resistência ficaria mais fria, isto se ela estiver dentro d’água e deveria estar, pois se não irá queimar rapidinho.
Como assim, você deve estar achando que eu pirei, não é mesmo?
Qual a resistência que fica mais fria? Que história é essa?
Já que estamos de falando esquentar, apresento-lhe a seguinte situação para “esquentar” a sua cabeça.
Você chega na padaria e pede um copo de café com leite quente.
A garçonete lhe entrega um copo tão quente que você nem consegue segurar, aí você pede a ela que “passe para outro copo para esfriar”.
Quando ela lhe retorna o “novo” copo você tem a sensação de que agora o café com leite está mais frio, correto?
Errado. Reparou que eu coloquei a palavra sensação em negrito?
Não acredita no que estou dizendo, então vou “provar”.
Se em vez da garçonete fazer a troca de copos ela lhe oferecesse um copo para você mesmo trocar, você notaria obviamente que o copo que ela lhe deu estava “frio”, ou melhor, na temperatura ambiente.
Feita a troca, você ainda acha que o café com leite está quente e pede um terceiro copo.
A garçonete lhe olha com cara feia, resmunga X!ᢽ7()#3=& (impublicável, pode ter menores lendo e aqui não é a novela das oito) e lhe dá “mais um copo” (frio).
Ao trocar de copo, pela segunda vez, você percebe que o segundo copo, que agora está vazio, não está mais a temperatura ambiente como quando a garçonete lhe entregou (com cara feia) e sim um pouco morno.
Onde estou querendo chegar com isso?
Para fazer a comparação dos chuveiros, em primeiro lugar devemos pressupor que ambos estarão recebendo o mesmo volume de água a mesma temperatura.
Fisicamente não é a água que esquenta e sim a resistência que esfria, porque a transferência de calor ocorre do corpo mais quente para o mais frio.
Tanto isto é verdade que se você ligar o chuveiro sem que esteja passando água a resistência irá “queimar”, ou melhor, fundir já que o calor produzido nela não estará sendo transferido para outro corpo, ou seja, a água.
Não acredita? Então por que usamos dissipador de calor nos transistores ou na CPU do computador, por exemplo?
Para esquentar o dissipador ou para esfriar o transistor?
Já parou para pensar nisso? Então, essa é a hora de pensar.
Voltando ao nosso banho de água quente (ou fria) vamos relacionar alguns tópicos para que possamos fazer a comparação de forma criteriosa e não pelo método “eu acho”.
- Considerando a foto tem-se a impressão que o comprimento total do fio da resistência A é menor do que da resistência B.
- Entretanto, não está explicito que a resistividade do fio das duas é a mesma. Vamos assumir que seja igual nos casos, bem como a área da secção transversal o que nos garantiria que o valor ôhmico da resistência A seria menor que o da resistência B.
- Os dois chuveiros estão alimentados com a mesma tensão e durante o mesmo tempo?
- O tempo de acionamento da chave que liga a resistência quando inicia a passagem da água é igual em ambos os chuveiros?
- E finalmente, uma observação mais teórica, mas que não pode desprezada, é saber se os recipientes dos chuveiros onde as resistências estão colocadas são exatamente iguais, seja no material usado para construí-los, seja no volume de água que comportam.
A segunda lei de Ohm
Vamos destrinchar um pouco o item 2 apresentando a relação conhecida como segunda lei de Ohm que nos dá o valor ôhmico da resistência de um corpo (no caso um fio) em função de três parâmetros : comprimento (l), a área da seção transversal (A) e resistividade elétrica ou resistência específica (ρ) .
Antes mostrar como se calcular a resistência a partir da segunda Lei de Ohm, talvez valha a pena falar um pouco sobre a resistividade elétrica que costuma ser representada por uma letra estranha que parece um “p”, mas na verdade é a letra grega denominada “rô”.
Define-se resistividade elétrica (ou resistência específica) como a “dificuldade” que um determinado material oferece a passagem da corrente elétrica e que não deve ser confundido com resistência elétrica embora ambas estejam relacionadas.
A resistividade é uma propriedade ou característica de cada material em uma determinada temperatura (geralmente medida a 20ºC) e expressa em Ω.m/mm2 .
Na tabela abaixo temos o valor da resistividade de alguns materiais condutores mais usuais.
Analisando a fórmula para o cálculo da resistência ôhmica (segunda Lei de Ohm) de um pedaço de fio pode-se concluir intuitivamente que para um mesmo material quanto maior o comprimento (l) maior será a resistência ôhmica e quanto maior for a área da seção transversal (grossura do fio), menor será a resistência ôhmica.
Esquentando a resistência do chuveiro
O aquecimento (não estou falando de temperatura que é outra coisa) produzido na resistência do chuveiro pela passagem da corrente elétrica, ou seja, a transformação de energia elétrica em energia térmica pode ser expressa pela potência elétrica que neste caso coincide com a potência real, pois o circuito pode ser considerado puramente resistivo será expresso em watts.
Para calcular esta potência podemos usar a fórmula:
Da qual se conclui facilmente que a potência (P) é inversamente proporcional a resistência (R) ou, no popular, quanto maior a resistência menor a potência e vice versa (para a mesma tensão E).
Considerações finais (como dizem os advogados)
Considerando os itens 1, 2 e 3 como verdadeiros, então a resistência A produzirá uma potência maior que a resistência B, já que sua resistência ôhmica será menor. Potência maior implica em mais “calor” emitido.
Conclusão
A meu ver a pergunta foi mal formulada, pois deixou de forma subjetiva, mas não explicita, que a resistência ôhmica de A pode ser menor que a de B pelo simples fato de que seu comprimento é menor sem mencionar a área da secção reta do fio (que fica também implícita como igual), mas não mencionar a resistividade, que é um dado relevante, eu considero uma “omissão grave”.
Sendo assim, já que está na moda, esta questão, “data vênia”, pode ser “judicializada” e cabe recurso no STF!
Antes de encerrar preciso deixar aqui registrada a valiosa colaboração do meu amigo Prof. Cesar Bastos com quem tiver a honra de trabalhar durante oito anos na Fundação CECIERJ.
Sua paciente leitura e releitura deste texto ajudando-me “ajustar” algumas palavras para expressar, com maior precisão e da forma mais simples possível, conceitos físicos envolvendo questões pertinentes à energia térmica para que não se confundam termos como calor, aquecimento e temperatura que na linguagem popular se misturam e são entendidos como “a mesma coisa”.
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