Testando capacitores eletrolíticos com o osciloscópio
Testando capacitores eletrolíticos com o osciloscópio
O parâmetro fundamental de um capacitor é, obviamente, a capacitância e durante muito tempo nós, técnicos (inclusive eu), pensávamos que ter um capacímetro resolveria todos os nossos problemas.
Aliás, antes dos capacímetros se tornarem populares, “tudo” em eletrônica se resolvia com um VOM analógico até mesmo o teste dos capacitores.
Com ele descobria-se se o “suspeito” estava em curto ou com fuga e ainda se estava “seco” e “sem carga”, ou seja, se “perdeu” a capacitância.
Quanto “perdeu” de capacitância não ficávamos sabendo, só se tivéssemos um capacímetro, coisa de laboratório “avançado”.
A essência do teste com o VOM analógico (e tem que ser analógico) é avaliar o tempo de carga e descarga do capacitor que depende, obviamente, da capacitância dele.
Não se media o tempo em segundos e sim o deslocamento do ponteiro pelo “olhometro” que, no início ia bem rápido e depois de um “certo tempo” ia devagar, “devagarinho” como diz Martinho da Vila.
Se o capacitor estivesse em curto ou com fuga o ponteiro travava em uma determinada posição da escala ôhmica e isso já era o bastante para se decretar a sua condenação sumária à lata de lixo da oficina sem lhe dar o “amplo direito de defesa”.
O que é fuga ou curto no capacitor?
Ela pode ser entendida como uma “resistência indesejável” que “aparece internamente”, em paralelo com o capacitor, sem ser convidada.
Na fig.1 temos o circuito equivalente de um capacitor com fuga ou curto e para descobri-la podemos usar a escola ôhmica de um analógico “du bão”.
Os tempos mudaram e hoje (quero dizer, há uns 20 anos, pelo menos!) se fala muito em ESR que se você ainda não sabe o que é recomendo a leitura do meu artigo “ESR – Você sabe o que é isso?”, embora, em alguns casos, o teste dos “velhos tempos” ainda tenha sua utilidade mesmo na Era Digital em que vivemos.
O que é preciso testar num capacitor?
No mínimo, precisamos avaliar três parâmetros: capacitância, fuga e ESR, mas é importante estar atento que estes parâmetros se comportam de forma independente e o fato de um estar correto não exclui a necessidade de verificar os outros dois.
A rigor deveríamos incluir também fator de dissipação, tangente ou ângulo de perda e ESL (Equivalent Serie Indctance), mas não quero complicar de mais a sua vida e por isso, ficarei apenas com a análise dos três parâmetros principais que são: capacitância, fuga e ESR.
Em outras palavras, mesmo que um capacitor apresente baixo valor de ESR ainda assim não pode ser considerado “bom” antes que se meça fuga ou curto e depois o valor da capacitância, da mesma forma que capacitância correta não é prova definitiva de que o capacitor “não é um corrupto”.
Aqui é bom abrir um parêneses e chamar a atenção de um fato. Um capacitor em curto ou com uma fuga muita alta irá apresentar na medição da ESR como se ela fosse muita baixa produzindo um resultado falso.
Eu gosto de seguir o seguinte roteiro:
- Medida de fuga com o meu velho amigo SANWA 320X, por exemplo.
- Medida da capacitância com um capacímetro, APENAS depois dele ter passado pelo “detector de mentiras” do multímetro analógico e não apresente fuga ou curto.
- E pra “fechar a questão” dou uma olhadinha na ESR.
A menos que o capacitor seja um “especialista em fraudes”, ele vai acabar “caindo em contradição” em um dos três testes acima e será condenado a prisão perpétua na lata de lixo.
E onde entra o osciloscópio nesta história?
Que tal aplicarmos uma onda quadrada ao capacitor e ver o que acontece com ela no osciloscópio?
A frequência da onda quadrada deve ficar entre 100 e 200kHz o que nos dá uma boa quantidade de harmônicos impares de ondas senoidais.
Então, além do osciloscópio vamos precisar de um gerador de ondas quadradas?
Se você possui um gerador de funções está na hora de usá-lo, mas se não possui não fique triste por isso.
Podemos construir um gerador de onda quadrada bem rapidinho usando o famoso 555 em modo multivibrador biestável como mostra a fig.2.
Para escrever este artigo montei o gerador numa placa de circuito impresso tipo mar de ilhas e usei como fonte um carregador de celular “abandonado” (tenho vários por aqui, são ótimos para alimentar pequenos circuitos).
O resultado final da minha montagem você confere na fig.3 e a onda obtida pode ser vista na fig.4.
Observe no destaque da seta amarela que a frequência obtida foi 104kHz e o valor pico a pico 3,6V (o osciloscópio está ajustado para 2V/div).
Antes de utilizar o “nosso” gerador para avaliar os capacitores e até descobrir a “quantas anda” a sua ESR, vou precisar saber a resistência interna do gerador.
Se você estiver utilizando um gerador de funções comercial este valor, geralmente, é 50 ohms, mas no projeto da fig.2 precisaremos “descobrir” o valor desta resistência o que é muito fácil como veremos a seguir.
Vale chamar a atenção dos iniciantes que esta resistência não pode ser medida colocando-se um ohmímetro na saída do gerador porque ela é uma resistência dinâmica produzida pelo circuito funcionando.
Como medir a resistência interna de um gerador.
Primeiramente não custa lembrar que os geradores (ou fontes)
podem ser divididos em dois tipos: gerador de tensão e gerador de corrente.
No nosso caso trata-se de um gerador de tensão que pode ser representado pelo circuito equivalente da fig.5 onde Ri representa a resistência interna do mesmo (se fosse gerador de corrente Ri apareceria em paralelo).
O primeiro passo será medir a tensão na saída sem nenhuma carga. O que já foi feito na fig.4 com o auxílio de um osciloscópio e nos forneceu 3,6V pico a pico.
A seguir colocamos uma carga na saída com um valor que estimamos ser próximo da resistência interna.
Eu optei por colocar um trimpot de 50ohms como mostra a fig.6 e ajustá-lo até que a saída caísse para metade, pois neste caso o valor da carga seria igual a Ri.
Em seguida retira-se cuidadosamente o trimpot para não modificar o ajuste e mede-se o valor obtido que irá corresponder a Ri. No caso em questão obtive 5ohms que corresponde à resistência interna do gerador construído com o 555.
Medindo a ESR com o osciloscópio
Agora que você já tem o gerador de onda quadrada e sabe o valor sua resistência interna, pode utilizar o osciloscópio para avaliar a ESR e até descobrir o seu valor.
Comecemos lembrando através da fig.7 o circuito equivalente de um capacitor considerando a existência da ESR.
Considerando uma frequência da ordem de 100kHz a reatância capacitiva será bem baixa e se a ESR também for baixa como deveria ser, ao aplicarmos a onda quadrada ao capacitor o valor pico a pico da mesma deverá sofrer uma redução considerável como podemos ver na fig.8.
Neste exemplo da fig.9 a aplicação do gerador ao um capacitor de 220µF (valor medido no capacímetro) a onda foi reduzida drasticamente de 3,6V pico a pico para 0,4V o que nos mostra que a ESR deve ser bem baixa.
Vamos entender por que.
Se calcularmos a reatância deste capacitor, considerando a frequência de 104kHz do gerador, obteremos aproximadamente 0,07ohms a qual estará em série com a ESR.
Assim, o capacitor representa para o gerador uma carga cuja impedância é formada pela ESR “+” Xc. Eu coloquei o sinal de adição entre aspas para chamar atenção que não se trata de uma soma aritmética e sim de uma soma vetorial, mas de qualquer maneira o resultado final dependerá da ESR, pois a reatância capacitiva neste caso pode ser desprezada para efeitos práticos e podemos desenhar o circuito equivalente da fig.10.
Fazendo as contas neste circuito iremos obter ESR = 0,625ohms
Agora olhe na fig.11 o valor da ESR medido.
Chegamos a um valor bem próximo com uma diferença de oito centésimos apenas entre uma medida e outra. Nada mal, não é mesmo considerando as aproximações que foram feitas.
Quer saber como cheguei a estes 0,625ohms?
Vamos chamar de VCAP a tensão medida sobre o capacitor com o osciloscópio e VG a tensão de saída do gerador sem carga que neste exemplo é 3,6V como vimos na fig.4.
Aplicando a Lei de Ohm ao circuito da fig.10 e desprezando-se o valor de Xc obteremos a seguinte fórmula:
Basta substituir os valores e fazer as contas com uma calculadora e chega-se ao valor da ESR. Simples assim!
Para convencê-lo da necessidade de se fazer, pelo menos, mais duas medidas (além de verificar fuga ou curto antes) para avaliar um capacitor apresento a seguir uma situação em que, embora a ESR esteja bem baixa, o capacitor está com uma capacitância abaixo do seu valor nominal.
Na fig. 12 temos a medida da ESR de um capacitor de 2200uF que nos dá 0,05ohms, portanto nada a reclamar.
Entretanto, ao medir sua capacitância encontrei 1,99mF que corresponde a 1990 mF como vemos na fig.13!
Percebeu que se eu tivesse apenas me baseado na ESR “absolveria” este “capacitor corrupto”.
Aqui vale uma observação. Os eletrolíticos costumam ter capacitâncias que variam de -20% a +80%, entretanto eu sempre prefiro utilizar os que estão com capacitância “para cima” por que se já começa baixo a tendência é piorar. Neste caso, comparando este capacitor (usado) com outros iguais novinhos achei capacitâncias sempre um pouco acima de 2200uF.
Vamos ver agora como vai se comportar no teste do osciloscópio um capacitor que está com uma ESR acima do aceitável (muito acima) e neste caso a capacitância também está abaixo do valor nominal.
Comecemos com a fig.14 onde temos o capacímetro medindo 28mF para um capacitor cujo valor nominal é 50mF.
Este resultado por si só já seria suficiente para condenar o dito cujo em “1ª instância”, mas para que não haja motivos para “recursos” vamos à medida da ESR que você na fig.15 com medidor convencional.
Você não está com problema de vista, é isto mesmo. O instrumento não está marcando nada o que significa que estou sua escala que é de 99 ohms.
Nunca é demais lembrar que o medidor de ESR pode ser usado também para medir resistência de baixos valores desde centésimos de ohms (muito útil atualmente) até 99 ohms.
Voltando ao capacitor já poderíamos condená-lo em “2ª instância”, mas como estamos no Brasil, não custa apelar para o “supremo”, quem sabe?
Olha só a tela do osciloscópio na fig.16 que corresponde a onda quadrada aplicada ao capacitor “duas vezes corrupto”.
É isso mesmo que você está vendo a fig.16 está igualzinha a fig.4, não houve nenhuma redução na tensão.
Não tem jeito – CONDENADO!
Considerações finais (como dizem os advogados)
Espero que este artigo tenha lhe dado algumas “lições de vida” interessantes no que diz respeito a testes de capacitores eletrolíticos e dentre elas que você tenha percebido que o osciloscópio não serve apenas para “ver figurinhas” como eu digo no meu livro Osciloscópio sem traumas.
Não tem medidor de ESR, não fique triste. Use o osciloscópio!
Outra questão que vale ser comentada é sobre os capacímetros e a medida de capacitância que merece bastante atenção. Existe mais de um método de se medir capacitância, por isso capacímetros diferentes podem apresentar leituras diferentes para o mesmo capacitor dependendo do método utilizado.
Então o que fazer, eis a questão? Usar o “método MT” (na dúvida Melhor Trocar)?
A resposta pode ser SIM, se o capacitor “novo” for “confiável”, se não …. a dúvida pode sair pior do que o soneto!
Como dizia o Velho Guerreiro “Eu não vim para explicar, vim para confundir.”
Até sempre
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