A escolha do capacitor eletrolítico correto
A escolha do capacitor eletrolítico correto
No último post tratei de um caso verídico, sobre a troca de um capacitor eletrolítico em uma fonte de um televisor AOC, que aconteceu com um técnico durante a reparação do mesmo.
Este caso levou-me a pesquisar mais sobre a questão da escolha do capacitor eletrolítico “correto” e me pareceu produtivo trazer a tona algumas questões que, às vezes, nos passam desapercebidas e podem ser de crucial importância na hora de executar um reparo de forma consciente e que não venha trazer consequências desagradáveis no futuro.
Todos os técnicos já devem ter percebido que nos últimos 10 ou 15 anos o maior índice de falhas dos equipamentos eletrônicos tem recaído sobre as fontes e em particular sobre os capacitores eletrolíticos que compõem os filtros das fontes chaveadas.
Parece-me, então que já está na hora, ou melhor, já passou da hora de perguntarmos por que isto acontece, não é mesmo?
Um pouco de teoria não faz mal a ninguém
Talvez valha a pena começarmos nossa analise relembrando como é a construção de um capacitor e, principalmente, a dos capacitores eletrolíticos para que os novatos na eletrônica possam acompanhar melhor o tema.
Em linhas gerais todo capacitor é composto de duas placas metálicas colocadas frente a frente e separadas por um material isolante que é denominado dielétrico como vemos de forma simplificada na figura ao lado.
O valor da capacitância depende de três fatores:
1) área das placas metálicas (diretamente proporcional à área)
2) características do dielétrico;
3) distância entre elas (inversamente proporcional à distância).
Trocando em miúdos, isto significa que para evitar áreas muito grandes, uma das alternativas costuma ser colocar as placas o mais próximo possível umas das outras, garantindo, é claro, que não se toquem o que será feito pelo dielétrico que precisa ser o mais fino possível se quisermos obter altos valores de capacitância.
Pra quem gosta de fórmulas, como eu, (afinal também sou professor de matemática) lá vai a que nos dá o valor da capacitância (C) em função dos três parâmetros citados acima: área das placas (S), distância entre as placas (d) e uma constante (e) que depende do material usado como dielétrico
Para conseguirmos capacitâncias bem grandes sem que tenhamos que construir capacitores fisicamente de tamanhos avantajados, temos que lidar com os parâmetros da fórmula da melhor maneira o possível.
O primeiro passo é enrolar as duas placas metálicas uma sobre a outra no estilo “bolo de rolo” lá de Recife ou o popular “rocambole” aqui do Sudeste.
A seguir, precisamos diminuir ao máximo a distância entre as placas e usar um dielétrico com e o maior possível.
E é aí que entra o capacitor eletrolítico onde um filme de alumínio recebe um revestimento de óxido e essa camada de óxido ficará em contato com um eletrólito viscoso (antigamente era líquido) mantido por outro filme de material isolante e poroso. A seguir um segundo filme de alumínio, sem revestimento de óxido irá completar o conjunto formando assim o capacitor.
Observe que, diferentemente de outros tipos de capacitores em que o dielétrico é composto por materiais “físicos” como mica ou poliéster, no eletrolítico temos um processo químico sujeito a uma espécie de deterioração por “envelhecimento”.
E aqui parece hora de colocar o primeiro alerta sobre o uso de capacitores eletrolíticos: – não devemos utilizar capacitores eletrolíticos, mesmo novos, que ficaram guardados por muito tempo.
Antigamente, no tempo do eletrólito líquido, uma boa prática era colocar estes eletrolíticos novos que ficaram guardados muito tempo numa fonte de tensão baixa, monitorar a corrente de fuga com um miliamperímetro e à medida que esta corrente fosse diminuindo íamos aumentando a tensão até próximo da tensão de trabalho de forma que a corrente de fuga se tronasse praticamente nula. Chamava-se este processo de reoxidação.
Creio que o mesmo poderá valer para os novos eletrolíticos. Fica a ideia para quem quiser testar.
Eletrolíticos são como iogurtes, deviam vir com prazo de validade!
O que mudou os eletrolíticos ou as fontes?
Eu arriscaria dizer que, em princípio, as duas coisas, mas comecemos falando das fontes.
Numa fonte convencional os eletrolíticos de filtro ficam submetidos a tensões pulsantes, oriundas de tensões senoidais, de frequência, no máximo, o dobro da frequência da rede elétrica (se for retificação de onda completa), 50 ou 60 Hz, dependendo do país.
No caso das fontes chaveadas, apenas o capacitor de filtro da parte primária da fonte, ou HOT como costuma ser chamada, trabalha sob o regime de tensão pulsante AC de 120 HZ (no Brasil, onde a frequência da rede é 60Hz), já que praticamente todas elas têm retificação de onda completa em ponte.
Entretanto, no secundário do chopper , ou seja no lado COLD da fontes as coisas mudam de “figura” (desculpem o trocadilho):
1) A forma de onda sobre cada diodo retificador não é mais senoidal e sim uma onda complexa “quase quadrada;
2) A frequência desta onda não é mais 120Hz e sim bem alta, atualmente da ordem de 100KHz ou mais.
Estes dois fatos e, principalmente, a frequência alta a que os eletrolíticos ficam submetidos são os principais pontos para os quais deve ser dada muita atenção no que se refere às especificações destes capacitores e onde reside a diminuição do tempo de vida dos mesmos.
O primeiro parâmetro “novo” que começou a ser enfatizado foi a ESR.
Até a década de 90 nunca havíamos ouvido falar nisto e na verdade a ESR tem pouca importância se trabalhamos com frequências baixas.
O desconhecimento do conceito de ESR levava os técnicos, e eu mesmo, a não entenderem porque um capacitor de “passava” pelo capacímetro não funcionava na fonte.
Pesquisando o assunto e na busca por uma resposta convincente acabei encontrando a causa “escondida” na ESR.
Levantei esta questão em vários escritos meus e nas minhas aulas e, pouco a pouco, fui conscientizando os técnicos da importância da ESR.
Como disse no post anterior quando parecia que todas as respostas estavam respondidas novas perguntas surgiram e esse é o lado da ciência que mais gosto, não existem respostas definitivas.
A verdade de hoje pode se tornar mentira amanhã.
O problema ocorrido com o Fábio é uma prova disso e ligou o alerta para darmos mais atenção a questão dos parâmetros dos componentes na hora da substituição.
Tanto que os capacitores que aqueciam na fonte do televisor não aqueceram quando ele os colocou com filtro em uma fonte de meia onda convencional, portanto trabalhando em 60Hz.
Ainda naquele post levantei a hipótese da ESL (Indutância Série Equivalente) que ainda é pouco conhecida, mas certamente ficará famosa em breve.
Outra questão importante na “vida” do capacitor é a temperatura externa ao qual o mesmo está submetido.
Capacitores originalmente especificados para 105ºC não devem (ou não deveriam) ser substituídos pelos de 85ºC sob pena de estarmos contribuindo para sua destruição num prazo menor.
Vale a pena ressaltar que sob a questão da temperatura em torno dos capacitores, muitas vezes, não temos nada a fazer dado o elevado grau de compactação cada vez maior dos equipamentos.
Outros parâmetros
Você já ouviu falar em absorção dielétrica? E em fator de dissipação (DF) ou tangente de delta?
Cruz credo, agora eu peguei pesado, não é mesmo?
Estes são conceitos que ficam escondidos nas entre linhas das páginas dos livros e só são vistos nos bons cursos de engenharia.
Não acho que você precise se aprofundar neles, mas pelo menos saber que existem e que se foram se tornando importantes à medida que os circuitos eletrônicos foram se sofisticando e chegaram ao nível que temos hoje e no que ainda virá por aí.
Vou falar rapidamente sobre cada um deles (pode servir para quando você estiver tomando chopp com um amigo e estiver sem assunto!).
Quando você fecha um curto nos terminais de um capacitor para descarregá-lo (NUNCA faça isto numa fonte chaveada) a tensão nos terminais do “infeliz” vai à zero, certo?
Errado! Não vai a zero não. Sempre ficam uns milivoltizinhos “perdidos” lá por conta da tal absorção dielétrica.
Em alguns circuitos estas “sobras” de tensão depois da descarga podem ser inconvenientes.
Para evitar esta “tensão duende” temos que usar capacitores com o menor índice de absorção dielétrica possível.
O fator de dissipação (DF) também conhecido como tangente de delta (tg d) é dado pela relação entre a ESR e a reatância capacitiva em uma determinada frequência. Outra maneira de calcular o DF e fazendo a relação entre a potência real (W) e a potência reativa (VAR) para o capacitor submetido a tensão alternada senoidal.
Num capacitor ideal a ESR é nula e, portanto o DF também será zero. À medida que o capacitor eletrolítico vai envelhecendo a ESR vai aumentando e como consequência o DF também.
Como escolher o capacitor correto?
Na verdade não tenho resposta para esta pergunta e escrevi o artigo mais com a intenção de alertar para os problemas e no caso deles surgirem você ter algumas questões para pensar do que fornecer a solução mágica.
Infelizmente, na maioria das vezes, poderíamos até garimpar na Internet informações técnicas detalhadas sobre os capacitores nos sites dos fabricantes, mas na hora de comprar não teremos escolha e o jeito será aceitar o que tem à venda e não o que tecnicamente seria o mais correto.
De qualquer maneira seja o mais cauteloso possível e em caso de alguma coisa não sair como deveria, faça como o Fábio, pois a solução pode estar na velha e boa sucata!
Antes de encerrar é bom que fique bem claro que não estou aqui fazendo apologia do uso de sucata para consertar os aparelhos e, principalmente, no caso de capacitores eletrolíticos há que se ter muito cuidado, fazendo medições da ESR e da capacitância e se possível da corrente de fuga, senão pode-se estar trocando seis por meia dúzia.
Em tempo; Os símbolos e e d usados no texto são letras que chamadas de epslon e delta respectivamente.
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