Usar 220 volts gasta menos “luz”?
Usar 220 volts gasta menos “luz”?
Volta e meia ouço alguém dizendo a besteira de que “usar 220V gasta menos luz”.
Isto me faz lembrar uma historinha que vou contar aqui.
Certa vez ouvi um pai “ensinando” o filho que começava aprender a escrever. O garoto tinha na folha a figura daquele bichinho branco que “só” aparece na Páscoa e precisava escrever em baixo da figurinha o nome do animalzinho.
O pai, com toda pompa e circunstância, soletrava para o filho-aprendiz: c – U – e – l – h – o!
Ao ouvir isto, a mãe, que estava na cozinha gritou de lá desesperada – “coelho” com U? Não saber ensinar, não ensina!
E o que o cUelho tem a ver com 220V?
A mesma coisa: – não sabe “ensinar”, então não ensina!
Dia desses estava eu numa lojinha de bairro, dessas que vendem de tudo, aguardando para ser atendido pelo balconista que mostrava diversos chuveiros elétricos a um cliente (antigamente era freguês).
Ao meu lado estava um cidadão de chinelo de dedo com uma chave de fenda e um alicate de camelô na mão, também esperando a sua vez.
O cliente do chuveiro estava em dúvida entre comprar um para 127 ou para 220V, porque tinha “ouvido falar” que o de 220V gastava menos “luz”. Preocupação plausível, agora que as eleições já passaram, a Dilma foi reeleita e a conta de “luz” que havia baixado um pouquinho antes, subiu um poucão depois.
O cidadão com a chave de fenda e o alicate, talvez quisesse demonstrar que era “eletricista” uma vez que trazia bem à mostra as duas únicas ferramentas que estes “profissionais” costumam usar, já foi afirmando categoricamente “é claro que 220V é melhor porque gasta menos luz”, enquanto gesticulava eufórico para mostrar seu (des)conhecimento deixou cair no chão o rolinho de fita isolante (também de camelô) que trazia enfiado no dedo indicador.
Neste momento não pude me conter e perguntei ao Sr. Zé Faísca: – o senhor poderia me explicar porque gasta menos?
Quase me arrependi de ter feito a pergunta, porque os olhos do homem se esbugalharam tanto que eu pensei que o “seu disjuntor” iria desarmra por sobre carga de corrente.
O cliente, neste momento, se estava em dúvida, com mais dúvida ficou e resolveu fazer coro a minha pergunta.
A resposta do homem da chave de fenda foi: – porque 220V é mais forte e assim vai gastar menos luz.
Mais uma vez não pude me conter e tive que retrucá-lo dizendo que aquela reposta não tinha embasamento técnico.
O cliente então resolveu me dar ouvido e pedir que eu apresentasse o tal “embasamento técnico”, enquanto isso o “eletricista” saia irritado e resmungando “esses engenheiro (sem plural mesmo) metido a saber tudo, eu vorto aí dispois”.
Comecei então a explicar ao senhor e ao balconista que também se mostrava disposto a entender a explicação.
Em primeiro lugar o correto seria dizer “conta de energia elétrica” e não “conta de luz” porque as concessionárias de energia elétrica, aqui no Rio a Light, nos cobram pelo consumo de energia elétrica e não pela “luz”.
Este termo, “conta de luz”, deve vir do tempo em que a energia elétrica só era usada para alimentar as “lâmpadas elétricas” que começavam a substituir as lâmpadas a gás, querosene ou outros combustíveis, então a única maneira de se produzir luz articialmente. Isto foi lá pelo final do século XIX quando Thomaz Alva Edison inventou a lâmpada elétrica.
Vamos dar uma olhadinha na “conta de luz”.
Reparou que está escrito “aConta de Energia Elétrica”?
Vamos dar uma olhadinha em outro pedacinho da Conta de Energia Elétrica?
No destaque vemos “Consumo 255 kWh”. Pois bem, a concessionária nos cobra pelo “consumo de energia elétrica” que neste exemplo foi 255 kWh.
Mas o que significa kWh?
Vamos destrinchar o significado destas três letrinhas: k, W e h.
A letra “k” é o símbolo de quilo que vem do grego kilo e vale mil.
O mesmo “k” que aparece no velocímetro do carro e na multa de excesso de velocidade, só que neste caso é “km/h”, ou seja, quilometro por hora (k de quilo, m de metro e h de hora).
A letra “h” é o símbolo de hora.
E o “W”? Bem, o “W” é o símbolo de “watt” que é a unidade de potência e que aparece na etiqueta do chuveiro como podemos ver.
Agora observem que tanto no chuveiro de 127 volts como no de 220 volts a potência é a mesma: 3200 W que é a mesma coisa que 3,2 kW.
Perguntei-lhes então, se estavam começando a perceber que o consumo, que é o resultado da potência medida em quilowatts (kW) multiplicado pelo tempo que o aparelho fica ligado (em horas), não dependia da tensão em volts, ao que os dois acenaram que sim.
Mas então por que surgiu este mito de que “220V gasta menos luz”, queriam saber?
Sinceramente, eu não sei. Se alguém souber, está com a palavra e é só mandar um comentário para o blog.
Outra pergunta pertinente que surgiu foi, então qual a vantagem de usar 220V em lugar de 127V?
Ah! Eis uma coisa que vale a pena saber.
Existem três grandezas importantes em Eletricidade que são a tensão, medida em volts, a potência, medida em watts (não confundir com consumo de energia que é potência multiplicada pelo tempo) e a corrente que é medida em ampères.
Estas três grandezas se relacionam pela seguinte conta: potência = tensão x corrente.
Vamos ver um exemplo e para tal vamos usar as etiquetas dos chuveiros.
Se o chuveiro for para 127V teremos: 3200W = 127V x corrente o que nos dará corrente = 3200W dividido por 127V igual a 25,19A (A é o símbolo de ampères, unidade de corrente elétrica).
Fazendo a mesma conta para o chuveiro de 220V obteremos, corrente igual a 3200 dividido por 220 igual a 14,54A.
Repararam que no caso do chuveiro de 220V a corrente ficou bem menor?
O balconista esperto, logo acrescentou: então o fio pode ser mais fino?
Muito bem cara, você é um bom aluno, disse eu.
O comprador do chuveiro queria saber qual era a vantagem de usar fio mais fino
A primeira vantagem é que o fio mais fino é mais barato, respondi e o balconista concordou.
Mas existe outra vantagem em se usar 220V, acrescentei. Se a corrente vai ser menor, então o disjuntor, que deve ser exclusivo para o chuveiro, também pode ser menor e, portanto também mais barato.
Então você vai “gastar menos” na hora de comprar o material e não na hora de pagar a “conta de luz”, concorda?
Se você quer saber mais sobre este e outros assuntos importantes para quem vive na nossa sociedade tecnológica, sugiro que leia meu livro “O que todas as pessoas precisam saber sobre Eletricidade”.
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Até sempre
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